Eleições Cruciais na Venezuela: O Futuro do País em Jogo
Os venezuelanos irão às urnas neste domingo (28 de julho de 2024) para escolher um novo presidente em meio a um período de grande tensão com os países vizinhos na América Latina. Sob a administração do esquerdista Nicolás Maduro, a Venezuela enfrenta uma crise econômica severa. Aproximadamente 600 venezuelanos cruzam diariamente a fronteira com o Brasil em busca de melhores condições de vida. Dependendo do resultado eleitoral e da reação do candidato derrotado, a situação política pode se agravar ainda mais. A oposição a Maduro acusa restrições durante a campanha. A candidata original, Maria Corina Machado, que venceu as primárias, foi impedida de concorrer pela Justiça local, controlada por Maduro. O novo candidato, Edmundo González Urrutia, teve dificuldades para organizar comícios. Ele emergiu como líder da PUD (Unidade Democrática), uma coalizão de 11 partidos de centro-esquerda e centro-direita, em oposição ao governo chavista.
Algumas pesquisas indicam que Maduro pode ser derrotado. No entanto, o sucessor de Hugo Chávez (1954-2013), que governou de 1999 até sua morte, alertou que, se perder, pode haver um “banho de sangue”.
Para o Brasil, um colapso democrático na Venezuela pode representar um revés político para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Apesar de ter recentemente criticado Maduro, Lula é visto como um aliado do governante venezuelano. A oposição brasileira acredita que Lula foi conivente ao longo dos anos com o que consideram ser uma ditadura no país vizinho.
Mais de 21 milhões de venezuelanos estão aptos a votar neste domingo (28 de julho), de acordo com dados do CNE (Conselho Nacional Eleitoral) publicados em junho. No total, há 21.620.705 eleitores na Venezuela, incluindo 228.241 estrangeiros. Maduro, no poder desde 2013, busca a reeleição pelo PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela), fundado por Chávez. A escolha da data da eleição, coincidente com o aniversário de Chávez, é uma tentativa de reforçar a conexão com o legado do ex-líder, ainda popular no país.
Durante seu mandato, Maduro foi criticado por enfraquecer as instituições democráticas na Venezuela. O Judiciário, as autoridades locais, as instituições eleitorais e as Forças Armadas ficaram cada vez mais sob controle do PSUV. Quando esses esforços falham, há relatos de repressão contra a sociedade civil, incluindo prisões de opositores.
Observadores internacionais estão preocupados com a integridade das eleições deste domingo (28 de julho). As preocupações não se limitam a uma possível fraude na contagem de votos, mas também à confiabilidade de todo o processo eleitoral. “Desde as eleições de 2013, surgiram questionamentos sobre como o processo é conduzido”, afirma Carolina Silva Pedroso, professora de Relações Internacionais da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e especialista em Venezuela, ao Poder360.
“Não se trata necessariamente de manipulação de votos, mas de avaliar se o processo segue rigorosamente a Constituição Bolivariana de 1999 e as regulamentações do Conselho Nacional Eleitoral”, diz ela.
Segundo a especialista, a desconfiança em relação à transparência do processo eleitoral aumentou após as eleições de 2013, que levaram Maduro ao poder. Em um contexto fortemente influenciado pela figura de Chávez, Maduro venceu com uma margem estreita, obtendo 50,6% dos votos contra 49,1% de Henrique Capriles, candidato da oposição pela Mesa da Unidade Democrática.
Capriles alegou fraude e pediu uma recontagem dos votos, além de questionar a legitimidade da candidatura de Maduro. Apesar das contestações, o CNE confirmou a vitória de Maduro. Ele, que era vice-presidente, assumiu como presidente interino após a morte de Chávez. A Constituição permite que o vice concorra a um novo mandato, mas exige que ele se afaste do cargo durante a campanha, o que não ocorreu.
“Até 2012, o sistema eleitoral venezuelano era considerado confiável e bem observado internacionalmente”, explica a professora. “No entanto, em 2013, as dúvidas sobre a interpretação da Constituição e a possível influência do Poder Executivo sobre outros poderes começaram a afetar a percepção internacional sobre a transparência do processo eleitoral.” Após meses de negociações, o governo Maduro anunciou em outubro de 2023, em Barbados, uma série de compromissos para assegurar uma eleição presidencial competitiva em 2024.
O Acordo de Barbados, assinado pelo governo e pela oposição, estabeleceu condições para o pleito, incluindo a realização das eleições no segundo semestre deste ano, a implementação de reformas eleitorais e a permissão para observação internacional. O acordo também garantiu a participação de críticos ao atual regime e definiu o processo para a realização de eleições primárias. No entanto, Maduro recuou logo depois. O governo não aceitou os resultados das primárias da oposição em outubro, nas quais María Corina Machado obteve 93% dos votos, mas foi desqualificada.
APOIO A MADURO Diferente dos pleitos anteriores, que consolidaram Maduro no poder, as eleições deste ano representam um ponto de inflexão: pela primeira vez desde 1999, quando Chávez chegou ao poder, a Venezuela apresenta uma oposição que conseguiu se articular com um apoio significativo nas bases. Algumas pesquisas indicam Edmundo González Urrutia com quase 60% das intenções de voto.
Para Silva Pedroso, apesar das dificuldades, Maduro tem, sim, apoio popular: “Se ele for reeleito, dependendo do número de votos, não devemos supor automaticamente que isso se deve apenas a fraude, intimidação ou coação”, afirma. “Embora esses fatores não possam ser descartados, existe uma parcela da população com uma visão política que vai além da questão ideológica.”
Segundo a professora da Unifesp, essa visão é marcada por um forte nacionalismo em relação à soberania sobre os recursos minerais e estratégicos da Venezuela, como petróleo, gás natural e ouro. “Há uma percepção de que a oposição, que hoje tem chances de ganhar, está fortemente ligada aos interesses do capital privado internacional”, diz ela. “Esse vínculo é real e documentado, especialmente no caso de María Corina Machado, que tem uma longa relação com empresas petroleiras, principalmente nos Estados Unidos.”
CRISE ECONÔMICA Sob a presidência de Maduro, o PIB (Produto Interno Bruto) da Venezuela encolheu 62,5% ao longo de uma década. Em 2021, 68% da população venezuelana estava em situação de extrema pobreza, e a taxa de inflação de 190% no ano passado foi uma das mais altas do mundo. Desde 2013, a população do país diminuiu em 11%, em grande parte devido ao êxodo de venezuelanos.